Capítulo 8 - Cinema

— Que droga, Bruna! – gritei ao raro vento de meio-dia, enquanto ela debruçava-se sobre a câmera digital sobre a escadaria. Meus fios de cabelo bagunçavam-se ao relento, e meus olhos comprimiam-se.
— Tudo por uma boa foto – respondeu, piscando o olho brilhante. Depois de ajustar o ângulo, correu até mim e agarrou-me. Fiz uma careta.
A câmera soltou um pequeno ruído de flash. Novamente, correu até o aparelho de cor preta e o fitou. Sorriu. Subi os degraus e tentei ver a foto. Razoável.
A única que salvava sempre era ela. Minha tentativa ridícula de ser cômico era idiota.
Em um movimento rápido e espontâneo, Bruna virou-se para mim e beijou minha bochecha. Pisquei, perplexo.
— Minha casa ou a sua? – perguntou, em um entusiasmo incomum.
O motivo era simples para tanta alegria: Mariana fora viajar, por emergência com a família, ontem à noite. Soube por cima que uma tia passou mal, e teve que ir ajudá-la, junto com sua mãe. Voltaria no sábado. Pedira para uma amiga e eu anotarmos a matéria, e eu estava cumprindo. Dava-me pena ver Bruna ter minha presença apenas para ela: ela realmente mudava de personalidade ao me ter por inteiro. Nunca se acostumaria em dividir-me.
— Sua? – indaguei, sem jeito.
— Pode ser – disse, séria. Depois, abriu um sorriso enorme. Pegou sua mochila à tiracolo e pôs-se a caminhar. Andei ao seu lado, sempre fitando o chão. Uma mania horrível de parecer sempre reflexivo, quando na verdade presto atenção nos ruídos e os pequenos seixos no chão de concreto. Ela, no entanto, acostumara-se com o silêncio proveniente desde que nos conhecemos.
Quatro dias sem ver Mariana. Agora que parecíamos praticamente namorados, quatro dias longe de sua presença iriam trazer de volta o velho Guilherme.
O solitário, depressivo e louco obsessivo por Bruna.
E já estava começando a entrar neste estado, parecia que ao lado dela, Mariana não tinha importância. Claro que ainda pensava em nossas conversas, nosso passar de tempo juntos nas últimas semanas, mas era mais claro ainda que eu não estava encantado com o beijo que tivemos. Com aquele passo em nossa relação.
Almoçamos em um restaurante vegetariano. Em casa, não havia ninguém: Mônica disse que almoçaria no trabalho, Belinda estava de folga e Mike fora ao veterinário.
Enfim, sós.
Bruna logo saltitou até o banheiro, colocando o biquíni. Troquei-me no quarto mesmo, louco para me refrescar.
Logo, meu desejo foi realizado.
— Fico me perguntando, Bru – comecei, pensativo. – O que pensará o pessoal se, por um acaso, eu começasse a namorar Mariana, e você continuasse freqüentando minha casa e vice-versa?
Ela que estava de costas, de repente parou.
— Que você, que antes duvidavam de sua masculinidade, agora seria um galanteador e tanto. Comigo, e com Mariana – murmurou com graça, depois de alguns segundos.
— Ah, fala sério – pedi, reprimindo um sorriso.
— E é. Você terá que dividir seu tempo comigo e com ela, como faz agora.
— Mas e se... até lá, eu fizer mais algumas amizades inseparáveis? – perguntei, agora colocando-a na parede. Não era esse meu objetivo, mas era um modo leve de vingança. Ela tinha que pagar por todo o amor que jogava para mim.
— Você, mais uma vez, teria ainda mais fama de galanteador. Satisfeito? – e riu, sumindo na água cristalina.
Acompanhei seu magnífico nado digno de uma nadadora profissional, contornando toda a piscina.
E num instante, saltou para cima.
— “Até lá”? – repetiu, com aspereza. – Quer dizer que você vai pedi-la mesmo?
Droga. Ela sempre era melhor que eu neste jogo.
— Modo de dizer – consertei – É uma hipótese. Não sei o que vem do futuro.
Silenciou. Não consegui ouvir ao menos o barulho dos carros da rua e da água.
— Você vai me avisar, se acontecer, não vai? – murmurou, como uma atriz experiente, a dor pairando em seus olhos. Nada mais esperado – Bruna fizera teatro desde os três anos.
— Não! – ironizei – Como você é insegura, Bruna! Já disse quantas vezes que será a primeira a saber?
E um jato de água, com risos perfeitamente doces, bateram-se em minha face.
Naquela tarde, Bruna foi embora mais cedo. Disse que teria que decorar falas para sua próxima peça, então assenti.
Mas claramente não era nada daquilo.
O relógio da sala marcava 18h. Perplexo com seu comportamento, passei meia hora embaixo da ducha. A água quente demais para o verão entorpecera meus músculos, queimando toda minha energia.
Exausto pelo esforço que não fiz, deitei-me mais cedo também.
E uma questão martelava minha mente. Eu estava machucando Bruna?
Que erro fatal ter certeza de que eu seria capaz de descobrir, quando isso ocorresse. Mas nem para isto eu era capaz. O melhor amigo com quem ela pode contar não consegue identificar quando ela está magoada.
Era óbvio pelo seu olhar quando referia-me de Mariana; além das outras poucas garotas, que comento.
Obviamente não era a mesma dor de quando ela falava de outros garotos. Mas ainda sim havia um sentimento não positivo. Seu brilho dos olhos todo era dissipado, a prata com safiras virava uma cor fúnebre e horrenda, sólida.
Desta vez não sonhei. Parece que meus pensamentos estavam dando uma pequena trégua, afinal estava cansado de tantos pesadelos significativos. Adormeci tão profundamente, que poderia dormir mais se não houvesse aula.
Um tanto insignificante, uma falta no diário dos professores não faria a mínima diferença.
Eu queria era encarar Bruna no dia seguinte.

“Vai-se a primeira ponto despertada
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada...
E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em brando e em revoada...
Também dos corações onde abotam,
Os sonhos, um por um, céleres, voam,
Como voam as pombas dos pombais;
No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais.”


Autor Desconhecido.


— Que lindo, Guilherme. Pode se sentar agora – disse a professora esbelta, com tom materno na voz fina.
Fechei o livro e voltei à minha carteira. Bruna lisonjeou-me enquanto eu guardava o conjunto de folhas na mochila. A aula de literatura nunca mudara de rumo; sempre era ganho pontos a cada poema, frase ou trecho trazido à classe.
O entusiasmante, era óbvio, que não era o fato de levar um poema à aula. Odiava poemas. Fora recomendado por Célia, amiga de Letícia. O que me tirava do sério é que a normalidade de Bruna era sentida até mesmo no ar da classe cheia de pessoas. Bruna, por um lado, com seus nove anos de teatro, poderia disfarçar muito bem seu desconforto com Mariana.
Por outro, ela realmente não estava interessada se ela pudesse interferir em nossa amizade.
Impossível, depois de tudo que aconteceu.
Então era mais provável a primeira opção. E, imagine, não estava sendo orgulhoso. Tinha quase certeza de que ela estava se passando por indiferente; até muito bem.
Não quis tocar no assunto. Se eu estava deixando-a infeliz, fingindo uma ilusão, para que cutucar a ferida?
Como era pedira, há meses, eu ia suturá-la. Dar de mim o que ela precisasse, inclusive minhas últimas forças, se houvesse necessidade. Seria o melhor amigo com quem ela pudesse contar.
Porque eu daria mais importância ao seu bem estar do que meu amor por ela, sem dúvidas.
Refleti durante o resto das aulas, no entanto estava determinado. Não seria pegajoso, tentaria apenas ser eu mesmo. Deixaria que a necessidade dela falasse mais alto, deixando que ela aprenda a dar o valor que quero. Não como um jogo, longe disto. Mais possivelmente uma estratégia sem falsidade: seria seu eterno melhor amigo até o dia em que ela não quisesse mais, ou estivesse pronta para me ter em seus braços.
Intervalo. A fonte de água cristalina e o cardume composto por carpas de diversas cores fora ativada, refrescando a área ao ar livre. Comprei uma soda, e Bruna, como sempre, comprara duas barras de granola. Sentei-me na beirada da fonte ao seu lado, enquanto os outros vinham com seus lanches.
O mesmo ritmo de conversa era praticado, habitualmente. O que mudavam eram os assuntos. Falavam sobre o que fariam depois da aula, logo mudavam de assunto, e o faziam constantemente. Eu, que falava de vez em nunca para dar minha opinião e questionar algo, contemplava a multidão reclamando do permanente calor. E... fitei o lugar no qual Mariana sentava, um banco de madeira clara perto às portas de vidro. Lá, beijavam-se Felipe e Melissa, da quinta série. Fiquei inconformado não pela atitude de Felipe, que diz ser apaixonado por Bruna e estar quase às obscenidades ali, mas sim por sua tentativa de jogar na cara dela de que ele não era tão dependente quanto parecia. Nunca se apaixonou assim por alguma menina, não pelo menos de que eu saiba, e seu histórico não é dos mais limpos. Obviamente, queria atrair Bruna, de um jeito bom ou mau, mas queria atraí-la. Mas essas tentativas falharam, e muito. Bruna sequer virou para fitar o resto do pátio. Seus olhos vagavam da água aos rostos de seus amigos, incluindo os meus.
Com a vergonha alheia pairando em meu rosto, que ardia pesarosamente, desviei o olhar. Continuei a passear com os olhos semicerrados por todo pátio, procurando alguma distração, além de prestar atenção na conversa.
Levantei-me, insatisfeito, enquanto Pedro vinha atrás de mim. Normal para eles, afinal sempre fora o quieto e anti-social da turma, tendo liberdade para sair a hora que quisesse da diária roda de amigos. Atirei a lata de soda vazia na lixeira, e caminhei direto para o banheiro. Pedro, sempre ao meu lado.
— É, vejamos como você se comporta sem sua namoradinha – disse em tom de alívio.
— Tentarei ser o bom e velho Guilherme, se me permitir – ri baixo, enquanto parava diante do mictório. Fiz o que tinha que fazer, enquanto Pedro ajeitava seus cachos no espelho. Molhei minhas mãos e o rosto rispidamente, por pouco não transpirando com as ondas de calor.
— Acho que estou realmente gostando dela – murmurei, enquanto secava as mãos no papel.
— Está brincando – riu, sem graça, com a expressão séria.
— Não estou. Se consegui beijá-la, acho que não significa que ela é igual as outras, não?
Suspirou.
— Minha mocinha está crescendo, consegue se desfocar de Bruna, que lindo – riu, enquanto eu tentava lhe dar um tapa.
— É um desfoque mesmo, nada se compara com o que eu sinto por Bruna. Mas com Mariana aconteceu alguma coisa, não sei.
— Rolou uma química.
— Deve ser – enxuguei minha testa, enquanto saía do banheiro. Andei de volta à roda, tentando entrar no assunto.
As duas últimas aulas foram praticamente livres. Atividades pequenas só, pelas férias estarem próximas. Não havia muito conteúdo a ser passado, e entusiasmei-me enquanto esboçava perto da roda mais agitada da sala. Esbocei exatamente o que via, alguns alunos conversando animadamente. Dei vida às cópias de meus amigos menos íntimos, mostrando o resultado, no final. Acostumado com os elogios e puxa-saquismo, agradeci a todos e preguei o papel ao mural da sala, junto aos tantos outros desenhos sem cor que fiz, somado aos trabalhos exemplares e fotos profissionais dos alunos também. O mural estendia-se por todo perímetro da classe, em três paredes. Apenas não cobria a parede da lousa branca. No começo de cada ano, pedia-se fotos de todos os alunos, de qualquer jeito. Poderia trocá-la quando quisesse. Mais do que isto: cartas, bilhetes, trabalhos e imagens o cobriam. E meus desenhos.
Obviamente a foto de Bruna era a mais divertida e criativa. Seu rosto fino e a pele ligeiramente rosada formavam a sintonia perfeita, reunindo uma careta mostrando os dentes perfeitos e os olhos, mais brilhantes como nunca. Abaixo, sua gata Kate exibia seus gloriosos olhos azul-claro, fitando impressionantemente a câmera. Minha foto era indiferente, dos ombros nus para cima. Meu cabelo estava pouco arrumado, do jeito sempre comum. Um pouco bagunçado, dando contraste ao fundo totalmente claro. Pendia levemente a cabeça para o lado, numa expressão meio divertida, meio misteriosa.
Decidimos ir cada qual para sua casa após a aula. Encontraríamos os outros no cinema, um filme aleatório. Estranhei o fato de combinarem em plena quarta-feira. Logo então, soube que era para tentarem juntar Victor e Letícia. Assenti, indiferente. Os dois se gostavam, precisavam de um empurrão.
Assim como eu também precisava, um grande empurrão.
Almocei apressado. Quase não senti o gosto do espaguete, logo depois indo tomar banho. Vesti uma camiseta e uma bermuda, correndo para a garagem.
Estacionei a bicicleta, indo direto para o cine. A azia fervia meu estômago, enquanto eu segurava minha barriga para não explodir. Cheguei na bilheteria, indo para trás de Victor, assim que o encontrei na fila.
— Por que não escolheram uma sessão mais tarde? – ofeguei, tirando duas notas da carteira.
Paguei duas entradas, e vi que Victor pagara apenas uma.
— Não vai pagar para Letícia? – indaguei, surpreso.
— Deveria? – perguntou, um pouco seco. Mas sabia que estava mais inseguro.
— Óbvio! Eu, que sou apenas amigo de Bruna, vou pagar para ela! – exclamei, com determinação na voz, mas meu rosto ardia. Corava quando mentia, ou quando queria que o sentido do que eu disse fosse o contrário. Afinal, Victor não fazia idéia da dificuldade de considerar Bruna apenas uma amiga.
O garoto dos cabelos negros e olhos azuis pôs-se a pensar, e retirou mais uma nota da carteira.
— Bom garoto – murmurei com riso na voz, enquanto saía para o lado.
Aos poucos, o grupo estava novamente reunido. Todos agora vestiam-se como oito adolescentes influenciados pela modinha, cada um no seu estilo. Bruna encantava-me e arrancava olhares de meninos aleatórios no hall do cinema com sua regata justa, os acessórios habituais como o cordão preto com um gato transparente de pingente e seus alargadores mínimos. E a calça jeans que pronunciava suas curvas. Os pares de olhos atrevidos dos meninos percorriam o corpo inteiro de Bruna, parando onde eu temia.
Com a maior intimidade que consegui, atirei meu braço sobre seus ombros, aproximando-a de mim. Não era a primeira vez que fazia isso.
— Obrigada – sussurrou com a voz acalorada, entrelaçando sua pequena mão esquerda na minha.
— Não há de quê – respondi, fitando com desprezo os demais garotos que agora desviavam o olhar. Aquilo divertiu-me de um modo que vocês não fazem idéia.
Entramos no cinema com lotes de sacos de pipoca e refrigerante. Tão fútil quanto prazeroso.
Um filme de ação, com vários tipos de armas e carros inclusos. Recostei-me, pronto para relaxar. Não deram algumas dezenas de segundos, e Paula, que estava ao meu lado direito, sussurrou:
— Não acha que está na hora?
— Vou falar com Pedro – fiz a voz mais baixa que pude.
Procurei por Pedro, que estava ao lado de Bruna. Cutuquei seu braço.
— Quer trocar de lugar? – murmurou Bruna, em uma voz mais audível.
— Shhh – pedi, com o dedo cobrindo a boca, voltando para Pedro – E os dois?
— Vamos falar com Victor – sussurrou, depois virou-se para Bruna. – você, Lílite e Paula falam com Letícia, obviamente.
Mudei de lugar com Bruna, e Lílite, que estava entre Pedro e André, veio para o lado das garotas. Silenciei meus movimentos para não chamar a atenção de Victor ou Letícia, que sentavam na fileira da frente. Chamamos Victor. Não foi preciso que eu desse sugestão alguma, apenas murmurei “Vá em frente!”, enquanto era quase claro os “sussurros altos” do grupo das garotas. Victor pôs-se a pensar novamente, enquanto fitava intensamente os fios lisos de Letícia, enquanto acariciava sua franja, rindo, corando. Algo que era possível notar-se de longe.
— Você gosta dela, não? – incentivou André, o jovem ainda não citado, de pele clara e cabelo oleoso.
— Está na cara – disse, fitando agora o chão. Dava-me pena. Seria impossível que ele amasse Letícia tanto quanto eu amava Bruna, mas ele era mais fraco e mais inseguro. Senti o orgulho subindo até meu cérebro, estampando-se em minha testa.
E então, as garotas pararam. Letícia fitou Victor, depois ambos desviaram o olhar em uma sincronia perfeita. Rimos em deboche.
— Tudo bem, eu vou.
Nosso coro de aclamação juntou-se ao das meninas, provocando irritação às pessoas que queriam assistir ao filme. Ignorei, empurrando Victor para o lado direito, onde os bancos estavam vazios.
— Vai! – murmurei com firmeza.
Letícia logo o seguiu, com a mão em sua face, provavelmente rindo de tanta timidez. Recostei-me novamente no banco, enquanto observava o mais novo casal sentando-se um pouco distante de nós.
Logo depois, percebi que suas bocas encontraram-se. Um envolvera o outro em um doce abraço, bastante desajeitado, porém. Não resisti e gargalhei, comentando da falta de prática de ambos.
Então relaxei.
Pousei meus agitados olhos na tela, onde uma cena monótona rodava. A falta de luz deixava o ambiente tranqüilo e intimidador. Bruna entretia-se com o celular em mãos, e ocupei a maior parte do tempo fitando seus olhos baixos, percorrendo a tela de seu aparelho.
Como eu queria que a cena de Victor e Letícia, ainda aos amassos, repetisse comigo.
Tentei concentrar-me no filme novamente, mas era sem possibilidade alguma. Filmes de ação por mim não deveriam ao menos ser gravados.
Enquanto agarrava mais pipoca, meus olhos encontraram uma turma de jovens barulhentos, que passavam pela porta e agora caminhavam em nossa direção. Gritavam e riam irritantemente, e meu conforto pós-missão cumprida dissipara-se.
O grupo ajeitou-se na fileira lateral, onde as conversas em volume ensurdecedor só aumentara. De nada adiantara as reclamações das demais pessoas, eles apenas curtiram ainda mais o momento.
Em torno de dez pessoas compunham as agitadas fileiras laterais. Fitei meus amigos, cada um, nos olhos, fazendo caretas de desprezo, enquanto tentava relaxar novamente.
Foi então, que os dez adolescentes observaram à sua volta, e comentaram alto, quase a ponto de podermos ouvir.
Dois deles, altos, fortes e que vestiam roupas largas, puseram-se de pé e caminharam em nossa direção. Gelei. Não bastasse que fizessem barulho? Obviamente, pelo meu cérebro já adaptado aos interesses da puberdade, já imaginara o que os dois garotos fariam aqui.
Pararam diante de Bruna, agachados.
— Oi – sussurrou um deles, o mais alto.
Bruna suspirou, irritada, assentindo ao cumprimento. Fitou rapidamente os dois garotos, e colocou-se a mexer novamente no celular, inquieta.
Cerrei meus punhos; estaria pronto para interferir quando Bruna precisasse.
— Então, meu amigo aqui quer conversar com você – disse o mesmo, enquanto apontava ao menino mais baixo, mas ainda maior que eu. Sorriu maliciosamente.
E, então, Bruna virou a cabeça em minha direção. Fitou-me com desespero.
— Eu... estou com ele – murmurou, com incerteza na voz. Hesitou. Gesticulou para mim.
Sorri sem mostrar os dentes, passando o braço por seu ombro.
— Ah, duvido! – exclamou ainda o mesmo garoto, com segurança. Mentíamos tão mal que era vergonhoso. – vocês não estavam abraçados!
— E daí? Estou com ela – afirmei, criando coragem. Queria que logo fossem embora, não suportava pessoas insistentes.
— Então prove! – parecia que o garoto estava ali para me atazanar, enviado de alguém que sabia minha história.
Irritado, virei a cabeça sem pensar.
Toquei de leve a bochecha de Bruna, enquanto avançava sobre ela.
No começo, sua mão tentou empurrar-me, o que provocou risos dos dois garotos.
— Eles não estão juntos coisa nenhuma – finalmente falou o outro garoto. Quis rir de sua voz, daquelas que caracterizam o começo da adolescência. Mas não importara, rocei meus lábios nos de Bruna, teria que aproveitar o momento. Os seus, rígidos e volumosos lábios não retribuíram, mas senti uma palpitação acelerar, vinda de seu peito.
Sua mão forçara contra mim, o que me fez parar. Virei aos dois garotos, que nesse instante estavam ao pé de Paula.
Comecei a rir, sem graça. Pousei a cabeça nas mãos, pensando no que acabara de fazer. Estava pirando, era impossível!
No entanto, não ouvi som algum de Bruna.
— Acha engraçado? – sussurrou a voz fria.
Levantei a cabeça. Bruna olhava-me sem acreditar em meu riso.
— Viu o que eu faço por você? – segredei, enquanto repousava as costas no banco reclinável. Sentia-me satisfeito.
— Não precisava ter feito isso! – ela pareceu irritada. Ignorei.
Incrível como um beijo orgulhava-me tanto.
— Eles te deixaram. Você tinha que me agradecer – falei, enquanto apanhava uma mão de pipoca.
Bruna não respondeu. Repensei no que havia feito.
Realmente, foi um fato que apenas um maluco apaixonado faria. O silêncio permanente cutucou meu orgulho, deixando o clima tenso.
— Obrigada – murmurou, com ingratidão, mas rendendo-se.
Sorri.



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